Maior terminal da América do Sul, que fechará o ano com R$ 4 bilhões em caixa, o Porto de Santos definiu para fevereiro a assinatura do contrato com a portuguesa Mota-Engil, vencedora do leilão, realizado em setembro de 2025, na B3, para a construção do túnel imerso Santos-Guarujá.
Ao todo, a obra vai custar R$ 6,8 bilhões. Deste total, R$ 5,1 bilhões serão divididos entre os governos estadual e federal. O túnel terá 1,5 quilômetro de extensão, dos quais 870 metros construídos abaixo do canal do porto.
A expectativa era de que o contrato fosse celebrado ainda no fim de 2025, mas o pedido de extensão partiu da empresa, a partir da necessidade da obtenção de documentos para o acordo. O evento de assinatura também irá marcar o início da fase de preparação do canteiro de obras.
A cerimônia, que contará com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do governador Tarcísio de Freitas, que tentam, cada um a seu modo, capitalizar politicamente sobre a iniciativa, será realizada oito meses antes da eleição para o Palácio do Planalto e para o Palácio dos Bandeirantes.
“Vejo que há uma disputa pela paternidade, e eu defendo que é uma união tanto do governo federal como do estadual. Não fosse o apoio de cada um deles, o projeto não sairia”, diz Anderson Pomini, presidente da Autoridade Portuária de Santos (APS), em entrevista ao NeoFeed.
A previsão é que a fase de preparação do canteiro dure todo o ano de 2026 e, em janeiro de 2027, a obra comece efetivamente, com o início das escavações. Com isso, o túnel deve estar concluído em 2030.
Além dos investimentos para a construção do túnel, a APS já tem destinado cerca de R$ 12,5 bilhões que serão aportados até 2028 em obras, como novos viadutos e a ampliação do calado do canal do porto, para receber navios maiores.
Seguindo o presidente da companhia, a posição de caixa do Porto de Santos mostra um modelo diferente da gestão adotada em outras estatais, como os Correios. Para ele, o mérito, neste caso, também deve ser dividido com a gestão anterior.
“O governo passado organizou o caixa. Eles queriam privatizar, o que é um equívoco, na minha opinião, e acabou não acontecendo. Mesmo assim, sanearam a empresa”, afirma.
“Recebemos [a APS] com R$ 2 bilhões em caixa. Hoje ela tem R$ 4 bilhões. Tratamos o porto como uma empresa privada. A gente manteve essa eficiência, integrou com o mercado privado e projetou o porto para o futuro.”
Segundo o presidente da APS, a decisão do Ministério dos Portos em seguir a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) de retirar os atuais armadores que já operam em Santos do leilão do megaterminal Tecon 10 é acertada.
“Decisão acertada. Se já 100% dos contêineres em Santos divididos entre a Santos Brasil, a BTP e a DP World, atribuir esse terminal para um deles geraria uma concentração de mercado. É correto que eles não participem”, afirma.
O Porto de Santos deve fechar o ano com uma receita líquida de R$ 1,4 bilhão, com um volume de 190 milhões de toneladas de cargas movimentadas.
Acompanhe, a seguir, os principais trechos da entrevista de Pomini concedida ao NeoFeed:
Anderson Pomini, presidente da Autoridade Portuária de Santos
Quando o contrato da construção do túnel Santos-Guarujá será assinado?
Será assinado até o dia 10 de fevereiro. Neste mesmo ato, a gente vai fazer a inauguração do canteiro de obras, com a presença do presidente Lula e do governo Tarcísio. Quando o canteiro é instalado, a equipe da empresa tem 12 meses para estudar o solo, fazer as desapropriações e refinar os detalhes do projeto. A escavação, de fato, começa em janeiro de 2027. Estava previsto para ser assinado entre dezembro e janeiro, mas a empresa precisou de mais tempo por causa da documentação e de certificados internacionais, inclusive para financiamentos.
O fato de 2026 ser um ano eleitoral, tanto para presidente quanto para governador, não pode atrapalhar o andamento das obras do túnel?
Vejo que há uma disputa pela paternidade, e eu defendo que é uma união tanto do governo federal quanto estadual. Não fosse o apoio de cada um deles, o projeto não sairia. Há uma dupla paternidade. E não acredito que o ano eleitoral atrapalhe. A governança do Porto de Santos é de alto nível, mesmo sendo uma empresa pública. Ainda que a política tente influenciar, a gestão do porto segue independente. E a obra deve ficar pronta três anos após o início das escavações. Ele vai ficar pronto no meio de 2030.
No orçamento de 2026, estão previstos R$ 3 bilhões em investimentos. Os recursos do túnel estão incluídos?
Nosso plano de investimentos segue um cronograma de várias obras de infraestrutura no porto, não só o túnel. Serão R$ 12,5 bilhões investidos entre 2025 e 2028. Somente em 2026 e 2027, serão R$ 6,14 bilhões em várias ações, como o aumento do calado do porto, para receber navios maiores, a perimetral, novos viadutos.
No início do tarifaço dos EUA, o senhor disse ao NeoFeed que o impacto não seria grande. Essa previsão se confirmou?
Sim. O que a gente exporta para os Estados Unidos não é tão significativo quanto o que a gente envia para a Ásia. Se a China aplicasse um tarifaço deste tipo, aí sim o Porto de Santos teria um impacto grande. O que vai para o mercado americano não corresponde a 15%. A China representa 60%. Há uma concorrência grande por cargas. Quando deixa de chegar carne, café, suco de laranja, as outras cargas ocupam o espaço no cais. Tanto é que, no primeiro mês do tarifaço, a gente teve um aumento nas cargas.
Qual tem sido o resultado da tarifa verde implementada pelo porto, de dar desconto para navios que emitem menos gases?
Nossa perspectiva é de aumentar ações para incentivar a prática de terminais e de navios que buscam descarbonizar o porto. Em 2025 já foram R$ 17 milhões de descontos em tarifas. Em três anos, esse volume já chega a R$ 40 milhões. O Porto de Santos tem a responsabilidade de incentivar essa pauta e dar exemplo para outros terminais portuários.
Quando deve sair o processo de concessão da usina hidrelétrica de Itatinga, que abastece o porto?
O chamamento vai ser feito em janeiro, para entregar a usina ao mercado. Hoje a usina gera 12 megawatts (MW) de energia elétrica e vai subir para 29 MW, com investimentos de R$ 500 milhões. Essa energia vai ser negociada no mercado e fornecer para o porto tudo que for demandado. E a nova empresa vai estudar a geração de hidrogênio verde, que pode ser usado para frota de navios. Será uma concessão de 25 anos, que vai incluir a revitalização da área da usina, que fica em Bertioga.
Com essas ações, o porto ganha em produtividade em relação a outros portos do mundo?
Sim. Há três anos, o Porto de Santos era o 43º do mundo. Hoje é o 37º. E com a previsão do leilão do terminal Tecon 10, vai ficar entre os 20 maiores do mundo em capacidade.
Qual sua avaliação sobre a decisão do Ministério dos Portos e Aeroportos em seguir as recomendações do TCU e tirar da disputa os armadores que já operam em Santos?
Decisão acertada. Se, hoje, 100% dos contêineres em Santos estão divididos entre a Santos Brasil, a BTP e a DP World, atribuir esse terminal para um deles geraria uma concentração de mercado. É matemática. É correto que eles não participem. A decisão foi unânime entre Antaq, TCU e Ministério de Portos. Todos se manifestaram neste sentido. E houve muita ação judicial neste período. Mas isso só atrasa o processo. Não há mais tempo a perder. O projeto está maduro. A gente precisa definir isso e começar a operação. O leilão será feito no ano que vem.
Como foi o ano de 2025 para o Porto de Santos?
O Porto de Santos é uma janela que representa o termômetro da economia brasileira. Se a gente tem o crescimento do PIB, a menor taxa de desemprego da história e a maior safra de grãos da história, tudo isso vai refletir no terminal. Estamos conectados diretamente com 200 países e 600 destinos. Com redução de emprego, as pessoas consomem mais e compram produtos industrializados. Por isso que o porto alcançou resultados históricos em 2025.
Isso significa o que em receita?
Estamos com expectativa de fechar o ano com R$ 1,4 bilhão de receita líquida. Até setembro, alcançamos R$ 1,29 bilhão, e a movimentação nos últimos meses do ano tem sido muito grande. Devemos fechar o ano com um crescimento perto de 4%. Vamos bater o recorde de movimentações do ano passado e chegar perto de 190 milhões de toneladas. Só em novembro, foram 19 milhões de toneladas.
Por que o resultado financeiro do Porto de Santos, que pertence ao governo federal, é bem diferente do de outras estatais, como os Correios?
O Porto de Santos está na contramão de outras empresas públicas, principalmente os Correios. A Autoridade Portuária vive hoje seu melhor momento, em termos de resultados financeiros, porque atua como uma empresa privada. E preciso dizer que este trabalho não é fruto só desta gestão. O governo passado organizou o caixa. Eles queriam privatizar, o que é um equívoco, na minha opinião, e acabou não acontecendo. Mesmo assim, eles sanearam a empresa. Precisa dividir o mérito. Recebemos com R$ 2 bilhões em caixa. Hoje ela tem R$ 4 bilhões. A gente manteve essa eficiência, integrou com o mercado privado e projetou o porto para o futuro.
Por outro lado, no caso dos Correios, a gestão anterior também tem responsabilidade?
Sim. Não dá para culpar só essa gestão. Atribuir a responsabilidade só aos últimos presidentes da empresa não é correto. Uma empresa é resultado de anos de planejamento e organização. Eu aproveitei o bom momento, afastei o discurso da privatização do porto e impus um ritmo de gestão eficiente. Da mesma que o governo anterior tem mérito no caso do porto, também é responsável por esse momento difícil dos Correios. A gente tratou a Autoridade Portuária como uma empresa privada.
